terça-feira, 30 de junho de 2009

Segredos da pintura





Adoramos segredos sejam eles de que natureza forem. Um segredo é sempre um segredo. A inveja e a hipocrisia fazem o resto. Há segredos de Estado, militares, industriais, artísticos e de alcova. Estes últimos são os mais apreciados e os de menor importância (sob o ponto de vista do progresso social); aliás, não têm importância nenhuma, excepto para os envolvidos. Numa palavra: Adoramos. Adoramos segredos.



Hoje ficamos fascinados perante a beleza criada pelos pintores no Renascimento italiano, pois bem, a maravilha da ilusão da perspectiva só foi possível com a invenção da câmara escura. Se, se, olhar bem para aquelas pinturas tão fascinantes destaca-se a escala, por excesso, das personagens pintadas. O tamanho é demasiado grande. A explicação é simples: - a máquina precursora do projector de diapositivos tinha os defeitos que tinha, ou seja, deformava a imagem dos modelos que se colocavam perante o artista. Coisas da tecnologia ou da falta dela. Em suma: segredos da pintura.

Esta obra, acrílico sobre tela, foi pintada em 2002 e é o resultado de séculos de descobertas que se iniciaram com Giotto (1266-1337) e que continuaram até aos nossos dias com a invenção da máquina fotográfica,da televisão, do cinema, do vídeo, do computador e do digital.

E vos deixo na companhia da música sempre sublime e genial de Chopin. É mais um “Nocturno, Opus 27#2”, piano.


segunda-feira, 29 de junho de 2009

Estado de alma










Hoje, ao olhar para esta aguarela, lembrei-me de um belíssimo poema, lido em tempos idos, e que pela autenticidade do sentimento expresso, me parece corresponder ao que busco neste meu trabalho. Tudo o que possa dizer será perturbador e atentatório da mensagem tão eloquente e sentida do amor perdido. E vos deixo com as palavras do António José Queirós - “Soneto da Inquietação” -, e com a música de Claude Debussy -“Claire de Lune”-, tocado ao violino por David Oistrakh em Paris no ano de 1962 e com Frida Bauer ao piano.





Soneto da inquietação

Olho a ponte, olho o rio, mas não vejo
quem meus olhos procuram cegamente;
corre o tempo, fica a dor e o desejo
que o mundo se acabe de repente!

Passa um dia, outro dia, já não sei
por onde se perdeu meu pensamento;
caem sombras nos sonhos que sonhei
debruadas de mágoa e esquecimento.

Com a vida, por vezes, não me entendo,
nem com seus alados véus de ilusão.
E enquanto o meu mundo vai morrendo,

em saudosas vigílias de paixão,
recordando o passado vou vivendo
numa louca e amarga inquietação.









domingo, 28 de junho de 2009

Luas


Esta aguarela é uma homenagem a todas as mulheres que vendem o corpo nas noites de luar.

Amsterdam







Num passado recente passei férias na Holanda. Eu vi paisagem, pessoas, arquitectura, bares, ruas, noite e, naturalmente, muitos museus. Jamais me esquecerei dos moinhos que fazem parte do mundo bucólico; do maravilhoso e do fantástico. Vi as flores, as tulipas sobretudo, os campos cheios de vaquinhas mas, mas também vi as montras onde as mulheres se vendem. Vi o melhor e vi o pior.


Vi extasiado A Ronda da Noite quadro pintado por Rembrandt (1606 -1669) e que marca a queda social do genial pintor. Vi maravilhado o museu Van Gogh (1853-1890) e não deixei de pensar que, quarenta anos antes, era eu ainda uma criança, me ofereceram um livro de mais de trezentas páginas: As Cartas de Van Gogh. O livro foi lido num ápice, tal o meu desejo de me identificar com a pintura. Coisas do passado.


Hoje lembrei-me do Jacques Brel e da canção Amsterdam.



sábado, 27 de junho de 2009

Cinco minutos






O que vos peço são só cinco minutos. Cinco minutos da vossa vida. Cinco minutos.

Se porventura acharem que não têm cinco minutos do vosso tempo - cinco minutos -, então, não têm tempo algum, nem nunca terão, para apreciar o que há de mais belo e sublime, nas vossas vidas em todas as circunstâncias. Pensem bem. Só vivemos uma vez, embora alguns julguem que não.
-Que são cinco minutos na vida de uma pessoa? É tão pouco e é tanto. Em cinco minutos nada se faz. Em cinco minutos podemos definitivamente mudar a nossa vida. Para sempre.

Ouçam em cinco minutos este trecho de ópera cantado por Callas em Paris em 1958 " Vissi d Arte" e ficarão diferentes. Definitivamente.

Em cinco minutos nada muda, e, tudo pode mudar, em cinco minutos. Cinco minutos!

Barcelos







Estive uma única vez em Barcelos nos anos 80. Foi um fartote. Comprei e comprei artesanato na linha da tradição expressiva deixada por Rosa Ramalho. As carantonhas pintadas com cores fortes fizeram as minhas delícias. Mais uma vez, a exuberância cromática, a liberdade das poses e dos gestos grotescos conquistaram-me. Vivo rodeado destas peças que ainda hoje, sempre que as observo, me seduzem. Obras de Júlia Côta e Rosalina Baraça, entre muitos outros, fazem parte do meu espólio. Eu sou uma esponja que absorvo tudo. É graças ao trabalho simples, autêntico e verdadeiramente genuíno do sentir, do pulsar deste povo, traduzido neste artesanato, que eu busco as minhas referências.

Como esponja que sou, estes meus desenhos, julgo eu, traduzem as influências que recebi da minha viagem a Barcelos.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

O primeiro gesto





Todos os dias, quando chego ao meu ateliê, o meu primeiro gesto é ligar a aparelhagem. Se a rádio não transmite a música que gosto, nem a entrevista que me cative, então, escolho, na minha lista de discos, aquilo que quero ouvir. O meu silêncio é a música. Não vivo sem a musicalidade, todos os dias. Sou um melómano dependente; eu que tenho por lema, não ter vícios, não ter dependências.
Hoje quero comungar convosco este vídeo que é a expressão da genialidade musical de Jules Massenet (1842-1912) tocado por Nathan Milstein -“Meditation.”

Londres, 1995





Não vou falar de Londres.

Não vou falar das visitas sem fim aos museus. Não vou falar das exposições que vi. Não vou falar dos passeios. Não vou falar da ida à ópera. Não vou falar dos concertos. Não vou falar dos bares e cervejarias. Não vou falar da parada militar. Não vou falar da poluição nas ruas. Não vou falar que comi tanta, tanta carne de vaca, antes de saber da doença das vacas loucas. Não vou falar do metro. Não vou falar de compras. Não vou falar do sentir e ouvir o inglês autêntico. Não vou falar da sensação de ter estado no centro do mundo. Não vou falar da paisagem humana e das cores de uns e outros. Não vou falar da riqueza. Não vou falar da pobreza.

Falo do prazer da música que trouxe de Londres nestes cds e das caixas de tintas que ainda hoje estão quase novas. Falo do ouvir, dias a fio, os excertos musicais, desta caixa que comprei na capital britânica e que comigo levo, muitas vezes, quando vou de carro. Falo do desejo de pintar, em guache( e por isso comprei a caixa de guaches), após ver um trabalho lindíssimo de Picasso numa galeria. E mais não falo.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Apesar de tudo






Apesar de tudo, apesar do que já se conquistou, apesar de tanto viver, apesar do saber adquirido, apesar de tudo, o mundo que é tão belo com os campos verdejantes, com o mar encantador e um céu deslumbrante; apesar de tudo, tanta angústia, tanta tristeza.


Não sei explicar, sei que ao ouvir - Gnossiennes No 1-, música de Erik Satie, sinto uma angústia, uma tristeza; no entanto, porque é bela não resisto e ouço e ouço, apesar de tudo.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Saber Dizer




Eu tenho tanto para dizer. Não sei como dizer. Umas vezes faço aguarelas; outras pinto em grandes formatos quando o tempo é mais longo e cheio de luz; outras vezes, então, escrevo. Outrora, era nos meus cadernos que construía teorias, agora, salpico aqui frases, neste caminhar desenfreado.
Quando me faltam as palavras recorro a Fernando Pessoa e ao livro O Livro do Desassossego. Está lá tudo, com a precisão de quem sabe dizer, o saber dizer.

"...Os sentimentos que mais doem, as emoções que mais pungem, são os que são absurdos – a ânsia de coisas impossíveis, precisamente porque são impossíveis, a saudade do que nunca houve, o desejo do que poderia ter sido, a mágoa de não ser outro, a insatisfação da existência do mundo. Todos estes meios - tons da consciência da alma criam em nós uma paisagem dolorida, um eterno sol-pôr do que somos. O sentirmo-nos é então um campo do deserto a escurecer, triste de juncos ao pé de um rio sem barcos, negrejando claramente entre margens afastadas..."

Ateliê




Bacon (1909-1992), um dos grandes pintores ingleses do século XX, um dia entrou numa casa, não virada para sul, ou seja, sem luz directa, e ficou, de imediato, magnetizado com o espaço. Ali teve a percepção que aquele seria o seu ateliê. Resultou. Foi lá que trabalhou e trabalhou com afinco deixando uma obra, considerada pela crítica contemporânea, das maiores dada a sua singularidade.

O espaço propriamente dito era de meter medo, de acordo com um vídeo televisivo. Tudo aquilo era imundo. As tintas estavam espalhadas pelo chão, as portas serviam de paletas, os materiais caoticamente dispersos por todo o lado numa penumbra nada propícia ao gostar de usufruir do espaço. Bacon sentia-se bem lá e produziu obra. Resultou.

Mondrian (1872-1944) nasceu na Holanda e mais tarde, o pintor, viveu na América. O seu ateliê é o paradigma da arrumação absoluta. Tudo naquele espaço estava no seu lugar milimetricamente colocado. Outros modos de ser e estar.

O meu ateliê é demasiado bonito. Bonito demais para um ateliê. Aqui tenho um sofá, uma televisão (que só serve para ouvir o canal Mezzo), o computador, uma mesa para escrever e pintar aguarelas, estantes com livros e muitos, muitos quadros. Esquecia-me dos meus brinquedos. Eu sou assim.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Viagens de Sonho





O ir por terras novas em busca do desconhecido é, por si só, uma procura do ideal da fruição. Dos prazeres terrenos viajar, por aí, na descoberta sabe lá do quê, é a afirmação da procura da diferença e do desejo de chegar a prazeres de vivência que não temos no nosso habitat. O desconhecido, o diferente, chega e sobeja para nos encantar e fazer construir castelos de sonhos. Como gostamos de sonhar. Sonhar com reinos de príncipes e rainhas encantadas, onde a beldade suprema, o prazer e a perfeição absoluta são a única vivência real. Como é bom esquecer as agruras, as maleitas e a fealdade das coisas e dos actos e partir por aí em busca do capricho e do esquecimento. Como é bom sonhar com o sonho.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Alegrias e Tristezas






Neste cruzar constante, onde o planeta é cada vez mais pequeno, conhecemos tanto. Tantos se cruzam no nosso deambular citadino e caminheiro em busca do elixir. Uns tornam-se nossos; outros, tão próximos de nós, estão porém distantes pelo não saber daquilo que nos une. Aqueles que acabam por fazer parte da nossa roda de conhecidos, amigos e companheiros são afinal o nosso universo. Parecem muitos e são bastantes nas alegrias do prazer; mas tão poucos nas desgraças da dor.

domingo, 21 de junho de 2009

Beijos



""Ouvia gabar os beijos,

Dizer deles tanto bem,

Que me nasceram desejos

De provar alguns também..."



Júlio Dinis in Serões Da Província

Educação






Educar é fazer com que outros sigam regras e princípios que julgamos correctos e salutares. É só isto. Tudo muda e, as atitudes e valores, valem o que valem em contextos e épocas diferentes. Comunicamos uns com os outros, de modos e com tratos diferenciados. Utilizamos processos e posturas de acordo com o meio, as circunstâncias e, naturalmente, de acordo com a moda.
A nostalgia não deve fazer parte do querer estar no passado que desapareceu. O que lá vai, lá vai. Assim é, e assim será sempre, queiramos ou não. O passado é o passado. A nossa memória só quase nos dá o que de bom aconteceu na viagem que realizámos, no passeio que fizemos, na festa que comemorámos; no entanto, como sempre acontece, os nefastos episódios deixam-nos com mágoas no momento dos factos, todavia, quando olhamos para trás, queremos só ver o melhor, o belo e até inventamos maravilhas que nunca existiram senão produto da nossa imaginação.
Hoje quero, com esta tela, falar de um modo cortês de bem amar que, só no passado distante, uns viveram e, outros, jamais saberão o que é a gentileza do saber estar e viver educadamente.

sábado, 20 de junho de 2009

Pessoas




Conheci gente e gente. Um mar de gente. Recordo com saudade uns, e outros, gostaria de os esquecer. Das pessoas que me marcaram, assinalo familiares que partiram e que me deixaram um vazio; tenho presente os amigos que, apesar da distância e do tempo, continuam fiéis ao espírito da camaradagem e do saber respeitosamente dialogar na diferença; estão comigo, no meu íntimo, professores e colegas que paulatinamente me presentearam com gestos de cortesia; agradeço aos que, pela minha postura, me consideraram merecedores do conviver, nem que fosse pontualmente. A esses, só posso estar grato, por ter usufruído, de momentos comuns.

Tenho nomes que um dia irei desvendar. A minha família será, obviamente, a primeira referência. E se falo deles é porque os pintores têm, através dos tempos, pintado os seus. Também eu pintei o meu círculo em diferentes momentos. Picasso pintou os filhos ainda bebés. Eu também pintei os meus.

Só gosto de pintar amigos e pessoas que me são próximas. A pintura, para mim, tem de ser o melhor ofício dos ofícios e para que assim seja - as pessoas de quem gosto - participam do e no meu trabalho.

Passado, Presente e Futuro





Demoro muito, demasiado até, a tomar consciência dos caminhos. Busco tanto que a busca se torna um labirinto, e assim é exactamente, porque, adoro a labiríntica procura. Hoje nada tenho em comum (se tenho não descubro) com o que fiz num passado recente e, muito menos, num passado longínquo. Quanto ao futuro, que farei eu enquanto criador?

Oscar Wilde escreveu no livro A alma do homem sob o socialismo:
“…O presente não tem importância. É no futuro que temos que pensar. Pois o passado é o que o homem não deveria ter sido. O presente é o que o homem não deveria ser. O futuro é o que são os artistas.”

sexta-feira, 19 de junho de 2009

A Dança




Não sei dançar. É um dos meus desgostos. E tenho muitos. Muitos. Um deles, é de não saber acertar o passo - o passo da dança. Incapacidade absoluta. Os meus pés tornam-se pesados, os movimentos presos e a liberdade dos gestos não fazem parte de mim.

Vivi rodeado de muita dança. Adoro a dança. Descobri, Rudolf Nureyev, muito jovem ainda e passado mais de trinta anos, não me esqueço, nem me esqueci da elegância e dos seus gestos subtis de dançarino, que fazem parte do meu gosto, pelo saber estar e como estar na dança.
Tango, danças de salão, festivais de dança e bailado fazem parte do meu imaginário de gustação pessoal. Do imaginário. Da realidade, não!

A minha realidade é a de criar obras que falem e expressem a dança, apesar de saber, quão longe fico do sentir de quem vive, no momento, o prazer da dança. É a vida.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Catálogos






Um dia um pintor amigo, para surpresa da minha parte, exigia ao galerista catálogos extra num número que achei, na altura, uma enormidade. Trezentos catálogos! Trezentos? Para quê? Tantos, com que fim?

Recordo agora que fiz, já faz um par de anos, uma exposição, da qual guardo um carinho especial pelo significado e importância, no que foi o meu trabalho, a partir daí. Dessas obras, nada tenho. Não tenho registos, não tenho fotografias, não tenho catálogos, não tenho pinturas. Nada. A exposição teve catálogos que se evaporaram nas mãos de quem visitou a galeria; as fotos tiradas no evento estão algures não sei bem onde; e as notícias nos jornais, essas, não fiz questão de arranjar e guardar. Hoje, compreendo esse meu amigo. Ele tem um historial do seu percurso devidamente documentado. Eu, pelo contrário, despertei tarde. Aqui e agora me confesso. Eu sou o João Alfaro.

Nota: para que não restem dúvidas falo da exposição realizada em Ponte de Sor na então Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian e lá está uma pintura da minha autoria.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A voz

A voz de Dieskau


Longe vão os tempos do silêncio e do saber escutar. Desde menino e moço que, por razões que desconheço, nunca fui dado à auscultação de certos sons. Quando se é jovem, o desejo de pertencer a grupos, a tribos de comportamento e a posturas radicais fazem parte da afirmação e da formação social. Queria ser rebelde como todos os meus amigos e companheiros de carteira, mas, mas com a música, não! Ao contrário do meu círculo de amigos rejeitei sempre, sempre os sons do rock. Os sons estridentes, as vozes roucas, as luzes estonteantes e os ambientes de dependência nunca fizeram o meu género. A música clássica tinha de fazer parte de mim. Quando descobri a música do Tschaikowsky, ao ver um filme sobre o compositor russo, tinha encontrado o meu caminho musical. Quando ouvi Dietrich Fischer-Dieskau descobri a voz - a maior, das maiores vozes.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Momentos Para Sempre





Não quero, não devo, não sei. Sinceramente não sei. Não sei falar do que faço. Apenas e só quero dizer através das cores, das formas e da minha sensibilidade o que penso, como penso e porque penso assim. Detesto a violência, a arrogância e a ingratidão. Detesto tantas coisas e amo tantas coisas. Amo os meus, o meu trabalho e o ainda estar vivo.

Este espaço terminará no dia em que tiver a consciência do negativismo das questões. O lado mau está presente em muito lado. Aqui não quero. Aqui sou eu, os sonhos, os desejos e o conceito de belo. E vos deixo com umas linhas do Gillo Dorfles in Oscilações do Gosto:

“ Se o nosso comportamento para as obras de arte do passado muda com a modificação da nossa atitude perceptiva e dos nossos condicionamentos ambientais, não devemos descurar o facto de que muito frequentemente o que faz mudar o nosso comportamento perante obras de arte contemporâneas pode ser o aparecimento de novas técnicas e de novos media…”

Paletas





Para quem não sabe, a paleta é o princípio de tudo. É aqui que começa a pintura propriamente dita. Aqui se misturam as cores. Aqui se faz a primeira escolha quanto ao cromatismo a utilizar. Aqui se clarifica o modo de actuar e como actuar.
Sou muito descuidado, ou talvez não, quanto à importância das coisas, dos bens pessoais e dos seus significados. Um antigo coleccionador meu, ao ver, as minhas paletas, pediu-me uma, e confessou na altura que, dos “seus “artistas, fazia questão de ter também não só as peças pictóricas, mas também, o início de tudo - paletas. A lareira, da minha casa, deixou de ter, no Inverno, a combustão oriunda das paletas. Coisas da vida.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Espelho Meu





Muitas são as histórias sobre espelhos. Quando era ainda uma criança vi uma sala cheia de espelhos disformes. Eu, que até àquele dia, pensava que o espelho me dava a minha imagem tal como era, descobri apavorado que, afinal, os espelhos perante a mesma pessoa dão resultados diferentes.

Momentos Mágicos




William Shakeaspeare:
"Quando fala o amor, a voz de todos os deuses deixa o céu embriagado de harmonia."

domingo, 14 de junho de 2009

Caixa de Lápis




Adoro comprar todo o tipo de materiais para trabalhar no meu mundo das artes plásticas. São as telas, são os lápis, são as folhas, são as aguarelas, são as tintas, são os pincéis, é isto e aquilo. Sinceramente já nem sei se alguma vez terei oportunidade, desejo, ou capacidade para utilizar tudo. Gosto, gosto muito de mergulhar no meu espaço e, com a minha música, construir as imagens que fazem parte do meu ideal de afirmação social, no entanto, não me esqueço do que escreveu Fernando Pessoa no Livro do Desassossego:
"Saber que será má a obra que se não fará nunca. Pior, porém, será a que nunca se fizer. Aquela que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso único da minha vizinha aleijada. Essa planta é a alegria dela, e também por vezes a minha. O que escrevo, e que reconheço mau, pode também dar uns momentos de distracção de pior a um ou outro espírito magoado ou triste. Tanto me basta, ou me não basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida."


Livros







A evolução do mundo resulta, em primeiro lugar, da natureza humana; depois, depois outros factores contribuíram para que, hoje, se viva como se vive. Nuns sítios bem, noutros pessimamente mal. - E porquê? As justificações são mais que muitas. Das razões maiores, para compreender o progresso, encontro o saber acumulado. Essa transmissão de conhecimentos, que se pode fazer de modos diferentes, encontrou a forma ideal de comunicar, passando de geração em geração, através do livro. E, foi o papel, esse material milenar inventado pelos chineses, que criou as condições para a divulgação do saber.

O livro foi durante séculos o veículo por excelência do combate à ignorância e ao despotismo. Ainda hoje, apesar do aparecimento da internet, continua a ser (o livro) uma das muitas formas do saber. Apesar do seu inquestionável interesse e importância, a sua aquisição, continua a não ser acessível a muitos dos mortais. Desgraças à parte, o livro está em todo o lado e, com conteúdos para todos os gostos. Graças a ele -o Ocidente - vive como vive.

Como homem da imagem, acabei também por dar o meu contributo a uma das maiores invenções de sempre – o livro. Modesta, sem dúvida, a minha participação na decoração de trabalhos editoriais, mas sempre orgulhoso, porque digam o que disserem, para mim, um livro é, será sempre, um objecto cultural. Ele é o cheiro, ele é a forma, ele é o conteúdo, ele é a substância que nos transporta para outros mundos, para outra realidade.

Esta fotografia mostra alguns dos mais recentes trabalhos que fiz na promoção e divulgação da palavra e da imagem.

sábado, 13 de junho de 2009

O Primeiro Beijo





Há momentos únicos que, exactamente por serem únicos, fazem com que o significado da nossa existência tenha a importância que tem. E, as coisas da nossa vida valem o que valem porque funcionamos por códigos de conduta. Por outras palavras, o que nos rege de um modo e não de outro é, naturalmente, a postura cultural. É, ela, a cultura que nos comanda. Os usos e costumes, as tradições, os modos de estar e ser, o bonito e o feio, o certo e o errado constituem o caldo da cultura. De cultura se trata. Cultura!

O primeiro beijo é, por questões culturais, um momento mágico. É mágico, se, se enquadrar nos estereótipos pré-definidos que pressupõem o consentimento mútuo, o desejo e muitas outras situações e questões que não quero agora referir. O primeiro beijo é mágico e será sempre mágico. Ponto final.

Esta tela retrata esse momento.

O Beijo






O beijo tem uma carga social muito grande. Como se sabe, beijar, obedece a regras de cortesia em determinados contextos, e, por isso mesmo, adquire significados múltiplos. Entre outras é por razões familiares, profissionais, culturais e naturalmente afectivas.
Esta tela retrata o beijo tendo como intervenientes adolescentes. Por razões profissionais, estou muito em contacto com os jovens. Porque sou um observador do meio envolvente, o meu trabalho pictórico assimila a realidade e transforma-a. Este tema tem sido usual, através dos tempos, e, é comum em muitas obras da criação artística; basta pensar em qualquer romance, filme ou fotografia. Longe vão os tempos, felizmente, onde o beijar era um acto herege se cometido em pecado, por ofender os bons (leia-se maus) costumes.
Como pintor, quis situar o ambiente, dentro de um contexto, onde, o afecto, na sua expressão mais pura, fosse a expressão do desejo e da descoberta dos amores naquilo que há de mais nobre. Ao observador cabe o juízo crítico e o julgamento da fruição das formas, das cores, das luzes, das sombras e por aí fora.



sexta-feira, 12 de junho de 2009

Livros de Registos


Gosto, de quando em vez, de escrever para me situar e questionar. O acto da escrita é, para mim, muito sofredor. Por razões que se prendem com a minha própria forma de ser e estar, vivo a vida com o dramatismo e o pessimismo inadequado de quem não tem queixas substanciais da existência. Eu sou assim.
As palavras no acto da escrita são rápidas, não demoro a expor as minhas ideias e a passar para o papel o que penso. Sou até, reconheço, precipitado naquilo que faço. Quase sem reler coloco de imediato o que escrevo na internet, e, depois é que vejo os disparates que fiz. Vou então a correr emendar a palavra que falta ou a letra que aparece no sítio errado. Peço perdão. Nasci distraído e distraído serei sempre.
Com os defeitos e tudo de mau que encerro em mim, eu gosto de expor o meu pensamento sobre o que me interessa e motiva.
Um dia entrei numa loja e vi uns cadernos pequenos e, logo aí, um súbito desejo da escrita em mim brotou. Nasceram as minhas “Considerações Estéticas”. Escrevi e escrevi sobre toda a problemática envolvente do meio artístico. Tudo o que nasce, também acaba. Quando os meus apontamentos se transformaram não em análises sobre a arte, mas sim, sobre as minhas lamentações e infortúnios artísticos deixei de escrever. Acabaram as “Considerações Estéticas”.
Esta fotografia retrata os livrinhos onde anotava os meus trabalhos e fazia breves juízos críticos e, também, as ditas “Considerações Estéticas”.

Os meus cadernos


Estes são alguns dos meus blocos de desenho. Aqui começo por conceber ideias para os projectos no âmbito das artes plásticas. Gosto de registar em locais que me sirvam de orientação e estudo permanente. O desenho é quase diário, aqui no papel, para o conseguir, muitas vezes faço só uma linha ou outra. Não posso parar porque nenhum atleta ganha corridas se não treinar todos os dias.
Aqui faço a minha história e a história dos meus desejos. Uns consigo concretizar, outros jamais os farei. É a vida. Quase sempre utilizo um só meio riscador. As cores são raras. A linha é a figura principal destas folhas. Linha a linha as formas surgem e as ideias ganham consistência. Esta é a minha forma de trabalhar. Primeiro o desenho e depois a pintura. Assim é o meu método igual a tantos outros, do passado e do presente.

Desenhos dos Cadernos


Não resisto a um qualquer suporte onde possa legalmente desenhar. É na areia da praia, nas janelas húmidas, nas toalhas de papel das mesas dos restaurantes, é no pó, é em todo o lado que com o dedo faço linhas e linhas e delas nascem as minhas figuras, os meus amigos, os objectos, as casas, enfim, o meu mundo.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Rosas e Rosas





Flores, muitas flores e mais flores fazem parte do meu mundo e, por arrasto, surgem no meu trabalho pictórico. As rosas, que invadem o meu quintal, têm sido a minha escolha para tantos eventos. Aqui e agora coloquei estas aguarelas em comunhão com a natureza na sua expressão mais bela e estética.








Os gestos definem a postura e a sensibilidade. O mexer no cabelo é uma busca constante na procura de uma situação, por vezes, de inquietude e de instabilidade mas, para mim, o que me interessa é captar o que há de mais autêntico e feminino. Adoro este gesto e não poderia deixar de o retratar. Eu sou um observador que regista, por acaso, no papel e na tela.




O Amor





O amor tem destas coisas. Os bons e os maus momentos fazem parte do ritual da descoberta e do assimilar dos desejos ou da falta deles. Falar deste tema é muito complicado e envolve questões que não sei expor utilizando as palavras convenientes e socialmente aceitáveis. É a química e ponto final.
Esta pintura de 2003 está na linha do retrato que adoro fazer. O ver surgir a identificação da semelhança entre o retratado e o emarelhado de linhas, cores, luzes, claro-escuro, sombras, texturas e materiais é, para mim, o expoente do prazer no acto do nascimento de uma obra.
O meu modo de ser e estar aparece naturalmente naquilo que faço. Gosto do silêncio, das falas murmurantes, dos gestos pausados e detesto o exibicionismo. A penumbra é o meu meio ambiente físico. A blogosfera é outra coisa. É o espelho que utilizo para falar de mim. Longe, muito longe.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Artesanato

As cores são parte do meu mundo. O artesanato utiliza, em certas regiões, quase sempre o contraste cromático como chamariz e característica dominante. Estas bonecas russas (como são conhecidas) estão hoje espalhadas pelo mundo fora.
O mundo está cada vez mais pequeno e a cultura hoje menos circunscrita a uma região e muito mais abrangente, ou seja, fácil é constatar que usos e costumes de países tão distantes fazem parte das atitudes e valores das novas gerações. A moda, melhor dizendo, as modas unificam e uniformizam, apesar das diferenças linguísticas, religiosas e até políticas. O que ainda num passado recente era bem característico e diferenciador dos povos, hoje, pelo contrário, o caminho é o da aproximação gradual. Felizmente que apesar dos avanços tecnológicos e da facilidade de comunicar ainda há quem queira reafirmar o direito à diferença.
Enquanto houver artesanato genuíno, que seja a expressão verdadeira do sentir dos povos, significa que ainda vivemos num tempo de criação nativa e não de afunilamento cultural. Apesar de ter comprado as" minhas" bonecas russas, na República Checa, como se fosse um produto genuinamente checo, onde se vendem aos milhares, a cor, melhor dizendo, as cores conquistaram-me.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Desenho




Hoje mostro uma página de um dos muitos blocos de desenhos. Aqui estão muitas memórias e projectos que paulatinamente fui fazendo e que me serviram de apoio para a concretização dos trabalhos finais. Começo sempre do mesmo modo. Primeiro vou riscando, riscando pelo prazer do gesto. Pois é. Gosto de ver nascer, da folha virgem, formas que se edificam e constroem outros mundos, ora reconhecíveis, ora meramente abstractos. O tempo e o modo fazem o resto. Se tenho disponibilidade, as formas crescem e a minúcia, formal do tema, é mais delicada e trabalhada. Se, pelo contrário, como acontece amiúdas vezes, o horário não me permite deliciar-me demoradamente com as descobertas das formas que nascem no instante, então, o resultado final é, apenas e sempre, o gostar viciante de desenhar.

Aguarelas



Depois de descobrir o prazer da aguarela, de prazer se trata, entrei num novo campo da divagação e da multiplicação temática. Vamos ao início da história, se se de história se trata. A tela tem atrás de si um historial e uma carga emotiva muito grande, que irei um dia destes relatar. A aguarela, pelo contrário, porque tem como suporte o papel, traz consigo uma emotividade substancialmente diferente, segundo o meu julgamento e juízo crítico, que vale o que vale.
Quando preparo uma tela é preciso um tempo de maturação e uma busca até angustiante sobre questões formais, materiais e conceptuais. A aguarela tem também um tempo de sofrimento, comum aliás a toda a produção artística seja ela do escritor, do gravador, do realizador ou de outro qualquer criador estético. Confesso que a parte inicial é sempre a mais difícil de executar. O desenho está muito subjacente e como a linha é a excelência da minha representação visual, o nascimento e respectivo enquadramento figurativo chega a ser um tormento.
O prazer que a aguarela me dá reside sobretudo na liberdade temática que me leva por caminhos do surreal, do metafísico, do bucólico, em suma, por todo o lado. E, por todo o lado, a tela e a pintura de cavalete não são impeditivos. Pois não. Mas eu não consigo. Com a aguarela o infinito temático é o limite. Com outros materiais, nomeadamente a idolatrada pintura a óleo, eu não consigo. Eu sou assim.

domingo, 7 de junho de 2009




Mozart é outra das minhas paixões. Tenho toda a sua obra discográfica. É um regalo. Gosto de ouvir e ouvir e voltar a ouvir quer as óperas, quer os concertos do maior génio, de todos os tempos, da música. Não me canso de repetir dias a fio os mesmos gestos. Coloco o CD e não saio do meu espaço, por nada deste mundo, enquanto os sons brotam. Cada nota parece-me melhor que a anterior. Tento descobrir o andar do que ouço e sempre sou surpreendido pela descoberta de novos caminhos sonoros. A arte é isso mesmo. Uma descoberta constante de novos caminhos sempre diferentes. Quão longe eu estou e pequenino me sinto perante a imensidão da criação mozartiana. De quando em vez, a humanidade engana-se, e, brota seres que excedem tudo o que se possa imaginar. Mozart é inanarrável. Tudo o que possa dizer dele quanto ao seu génio é pouco para a grandeza do seu valor e contributo para o prazer da fruição musical.



Adoro brinquedos. Tenho muitos. Uns de lata, outros em madeira. Afinal, mais não faço que juntar objectos que fizeram parte da infância de muitos portugueses. Gosto das cores e das formas, e, também, por arrasto, das histórias e das memórias dos meus tempos de menino e moço. Colecciono porque esteticamente me seduzem, mas, mas o que quero é que eles me sirvam para os meus trabalhos pictóricos. Muitos foram os momentos em que optei por colocar na temática das minhas obras o brinquedo. Quando viajo, vejo sempre muitos museus e se encontro algum que seja do brinquedo, eu visito.


Um dia, um grande amigo meu, apresentou-me um editor do Porto. De tanto livro fazer, queria, na altura, editar algo diferente. Por outras palavras: o objectivo era fazer uma obra distinta, onde a escrita e a pintura fossem uma combinação perfeita, numa edição de referência. Como sempre, quando sou solicitado, azar meu, os prazos são sempre curtos. Como sempre, nunca digo não. Mais uma vez, tinha um desafio pela frente. Que fazer? Como fazer em tão pouco tempo?
Experimentei técnicas e materiais vários, no entanto, porque tinha presente a excelência dos trabalhos vistos no Centro Cultural de Belém, aquando da exposição antológica do Mário Botas, eu, que nunca tinha feito nada com aguarelas, lançei-me ao desafio. E assim nasceram as minhas aguarelas.