domingo, 29 de julho de 2012

Férias exóticas










“Dançarina”, Pintura sobre tela de 2012


Aqui, neste país à beira mar plantado é chegado o momento - para alguns - de saborear os prazeres do verão, as vantagens do calor e do repouso que traduzem o período estival e, sobretudo, esquecer um ano de trabalho. É frequente ver outro encanto nos rostos, nas posturas e nas expectativas quando o sol aquece. Todos ficam diferentes. Depois logo se vê. Agora é a fase dos prazeres e dos sabores: das viagens, das diferenças comportamentais, dos desejos. Como é belo sonhar. E nada mais interessa. Até ao despertar do desencanto.

Viajar é ir em busca de algo novo. Há os que procuram a preservação da natureza e as belezas ainda existentes de um passado que se quer prolongar; há os que buscam a inovação e tudo o que a modernidade tem para dar. Estes dois modos de descoberta procuram o exótico, o diferente e, naturalmente, o mistério da vida e das coisas.

E é nesta mescla de descobertas, viagens, desejos e sonhos que o exotismo ganha relevo: nunca se viajou tanto; nunca tantos comungaram diferenças culturais como hoje; nunca tanta gente conheceu tanto em tanto lado. E, no entanto, as guerras continuam. E há os que gostam de copiar, de adulterar outros modos de ver e sentir. Bem longe, ou tão perto se faz igual, como se fosse possível transpor a História e as tradições numa aparência visual. É o que acontece, neste mundo de enganos. Como é bom fingir que a vida é bela.

E de mentiras se constrói o caminho, porque tudo é breve. Aqui vai um, ali outro e todos, todos vivendo ou desejando exóticos destinos e vivências felizes, numa fantasia de enganos, que é, afinal, o que se vive, sobretudo, nos dias tórridos de verão…


E vos deixo com as palavras de William Shakespeare que disse um dia:

“Se todo o ano fosse de férias alegres, divertirmo-nos tornar-se-ia mais aborrecido do que trabalhar.”
  

domingo, 22 de julho de 2012

O espelho








“Quem é mais bela do que eu?”, Pintura sobre tela de 2012

O espelho mostra-nos o lado exterior de nós próprios. É um dos modos de nos reconhecermos fisicamente num mundo de gente semelhante e, curiosamente, todos tão singulares. É verdadeiramente mágico que na imensidão humana se consiga ser diferente, mesmo tão iguais na aparência. Tanta gente. E há qualquer coisa em cada um de nós que nos distingue e diferencia. É maravilhoso que assim seja, no entanto, porque cada pessoa é única, e, por isso, insubstituível, as mágoas são muitas quando alguém parte…
E o espelho é, também, o palco das vaidades em que se procura ver o corpo belo, para obedecer aos rigores estéticos do momento, mas não há formosura que resista ao tempo…
 

Quanto ao nosso lado interior não há espelho que mostre o que nos vai na alma, embora os olhos digam muito, porque são um indicativo de alegria ou tristeza. Felizmente que há um cantinho, dentro de nós, só nosso, onde guardamos os segredos e as lamentações... dos “pecados” ou da falta deles. Bem longe dos espelhos...


 
E vos deixo, mais uma vez, com as palavras de Fernando Pessoa que disse um dia:

 “Do indivíduo temos de partir, ainda que seja para o abandonar.”

domingo, 15 de julho de 2012

Dormir






2012, “Dormindo” pintura sobre tela.

Sonhei tanto e fiz sonhar outro tanto. Com verdades e mentiras à mistura. Imaginei este mundo e o outro. Galguei montes e vales, mares e céus. Inventei cenários idílicos de dia e de noite. Agora vivo das recordações. Das boas e das outras. Da saudade, sobretudo. E aqui estou dormindo na paz dos anjos, ora imaginando, ora construindo projetos, que valem o que valem, neste andar de procuras e de encontros estéticos, onde o interesse de ontem é apenas um vislumbre, porque o que conta, hoje, é a serenidade e a acalmia dos ímpetos. E o tempo passa entre dormidas e panaceias, em que a arte é a força motriz e a razão principal da significância deste meu andar por aqui. Até ao juízo final.


E termino com um excerto do poema “Dorme, que a Vida é Nada” de Fernando Pessoa, in Cancioneiro:

“Dorme, que a vida é nada!

Dorme, que tudo é vão!

Se alguém achou a estrada,

Achou-a em confusão,

Com a alma enganada…”



segunda-feira, 9 de julho de 2012

Hopper em Madrid






Madrid. O calor aperta e a luz é imensa. As pessoas correm de um lado para o outro com roupas suaves, luzidias, oscilantes e, até, algumas, com vestes sensuais, tão próprias da época estival, aproveitando, assim, os primeiros dias da nova estação que transporta consigo as alegrias do verão. Da multidão vejo surgir um homem vestido de negro acompanhando uma jovem coberta, também, de um longo e inapropriado (julgo eu) vestido igualmente negro, com um enorme lenço cobrindo a cabeça e apenas deixando perceber os olhos. Enfim. É o caldo cultural dos nossos dias. A liberdade é o direito à diferença, mesmo para os que querem impor a unicidade. E enquanto o Museu Thyssen abre as portas à retrospetiva da obra pictórica de Hopper (1882-1967) - razão principal da minha visita à capital espanhola -, vou olhando o que me cerca e pensando na maravilha que é alguém conseguir captar o interesse de tantos, apenas e só porque pintou o que lhe ia na alma, bem longe das modas do seu tempo e dos fundamentalismos que cada época comporta. Este pintor, americano, soube conciliar a mestria técnica com a conjugação temática baseada essencialmente nas emoções humanas, onde não há moda ou radicalismo que suplante aquilo que é a nossa essência. A sua pintura é influenciada pelo cinema mas, curiosamente, também, cineastas recorrentemente constroem cenários tendo como ponto de partida a pintura de Hopper. A sua obra é tão pungente que os anos passam, as modas também, e o interesse pelo seu trabalho cresce, apesar de muito divulgado, porque ver "in loco" as pinturas dá ao observador outra dimensão, que só é possível captar estando frente a frente, olhando diretamente, vendo a harmonia cromática perfeita, a pincelada solta e o admirável jogo da luz e da sombra, em que as personagens pictóricas se identificam com cada um de nós, independente das opções e dos conceitos de vida que perfilamos, ou não fosse a arte uma expressão da vida.

E vos deixo com as palavras de Simone de Beauvoir que disse um dia:
“É na arte que o homem se ultrapassa definitivamente.”

domingo, 1 de julho de 2012

Outras leituras







2012, "Outras Leituras" pintura sobre tela, 100x60 cm




Muito se lê e escreve hoje. A internet criou novos hábitos de leitura e escrita. O leque dos que através das palavras comunicam com os outros aumentou exponencialmente. A democracia dos ideais passou a ser não um exclusivo dos pensadores das grandes causas mas, sobretudo, um desabafo de todos os que utilizam as novas tecnologias para dizerem de sua justiça, certamente, cheia de impropérios, mas a voz popular é, agora, mais global com as vantagens e os inconvenientes do pensamento imediato e emocional das multidões.
É triste ver que os livros – em papel – estão a desaparecer nas nossas casas, nas salas de espera, nas viagens, nos cafés, e com isso os hábitos de saborear, também, o objeto artístico, porque um livro é um conjunto de palavras, imagens, texturas, cheiros e com um passado milenar, que permitiu a evolução civilizacional do Homem graças ao acumular de informação. Mas o progresso é assim mesmo. As novas gerações terão como suporte comunicativo o visor dos computadores e, o passado legado nas folhas de papel será apenas uma memória, ou não fosse a nossa existência, um saudável e maravilhoso recordar, em que o futuro é já amanhã, e isso é que importa. Mesmo sem livros em papel. Para meu desgosto. E de muitos mil.

E vos deixo com as palavras de Julien Green que disse um dia:

“ Um livro é uma janela aberta pela qual nos evadimos”.