domingo, 24 de abril de 2016

Não são cravos não






“Natureza X” , 2016


Pintura sobre tela de 54 X 81 cm




Aquele adolescente que viu chegar, aqui, o dia que mudou a vida de todos, é hoje outro. O país também. E muito. As ideias fantasiosas de um amanhã cheio de luminosidade vieram apenas demonstrar que a natureza humana ora esquece, ora deturpa, ora mitifica isto e aquilo. Da esperança ao desencanto foi o que aconteceu, e,  ao ver, com olhos de ver, tanto oportunismo, tanta injustiça, tanta hipocrisia, tanta falsidade, tanto bofetear este povo, que deu cartas ao mundo, sereno e sensato,  e que lá vai lutando, apesar de  resignado muitas vezes, apoiando os seus heróis ideológicos, que apenas são capas para ocultar a verdade escondida nas sociedades secretas, transversais aos partidos onde ,realmente, se traça o destino de todos. É tão bom gritar alto o que nos vai na alma, sem constrangimentos e sem medos. Mas difícil é acreditar, quando já não se acredita. Amanhã é outro dia e talvez renasça a esperança. Talvez. Com gente mais séria, solidária, onde a justiça não seja um emaranhado de labirínticos caminhos; a educação um espaço de debate e aprendizagem e não um território de subserviência à libertinagem; a segurança um valor maior e não com a sua inversão. Enfim, um país feliz e não, como acontece hoje, tanta gente sem esperança, apesar de tudo de bom e sublime que foi feito nestas quatro décadas e que nos orgulha a todos.







 Não são cravos não. Indiferente à grandeza e à miséria dos homens a primavera chega todos os anos cheia de cores, cheiros e formas, enchendo os campos silvestres num frenesim de vida e azáfama animal. Como observador basta-me a paleta e a pintura surge naturalmente como reflexo do vivido e sentido. Esta série de doze telas sobre a natureza nasceu pela necessidade da descoberta constante e da procura persistente, porque viver é pesquisar. Sempre. Ou não fosse a arte um caminho de interrogação e de esperança.






E vos deixo com as palavras da escritora e filósofa francesa  Simone de Beauvoir que um dia disse:





“Em todas as lágrimas há uma esperança.”








segunda-feira, 18 de abril de 2016

Pelos caminhos do costume







“Natureza VII e VIII”
Pintura sobre tela de 30 x 100 cm cada




Por onde agora ando, o que faço, como vejo o que me cerca, acaba por constar na minha pintura. Ela é o retrato dos caminhos do costume. Com gente dentro, mesmo que seja a ausência a maior presença. Pelos meus caminhos procuro sempre olhar o lado belo da aparência. Ou é uma nuvem, mesmo muito carregada e anunciadora de um tempo agreste, todavia com cores vibrantes; ou é o vento que move o arvoredo e deixa ver as tonalidades escondidas quando o sol brilha ; ou é a chuva que cria espaços novos com a água que corre aqui e ali. Tenho um modo de ver e olhar para as coisas não como elas são, mas somente pintura em movimento com pessoas e espaços. Quero-me afundar neste deixar andar. Pouco mais espero das emoções da alma, apenas desejo saborear o pintar, comungar e deixar correr os dias, sempre na procura de novas propostas pictóricas. Basta-me pouco. Quase nada. E é tanto.



Agora, de novo, numa azáfama tenho de pintar doze telas para um espaço preconcebido, num tempo breve. O tema é a natureza, referência constante na história da arte. O que me fascina neste pintar diário é o surgimento de iniciativas que me levam a descobrir novos caminhos aliciantes. Como é bom. Sempre numa entrega obsessiva tudo caminha para o costume.






E vos deixo com as palavras do filósofo alemão Friedrich Wilhelm Nietzsche que um dia disse:



“Temos a arte para não morrer da verdade.”

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Quando um artista morre









Homenagem póstuma ao artista António Galvão






Quando um artista morre resta a saudade dos seus e um espólio para outros vindouros. Na escrita, nos espectáculos de palco, nas artes plásticas, no cinema e em todo o lado, fica o rasto da passagem dos que, pela paixão e entrega, criaram um mundo de fantasia e esperança, em que a morte física é apenas uma etapa até ao esquecimento final.



Quando um artista morre é lembrado o percurso e o conteúdo da mensagem de tanta energia comunicativa que a arte transporta. Fazem-se homenagens, colocam-se placas aqui e ali, flores, lágrimas e um vazio.



Quando um artista morre deixa uma marca neste universo de insignificância, que é a eterna procura do significado da nossa existência e o porquê dela.



Quando um artista morre, na catalogação da sua obra, surgem uns e outros circundando ora no silêncio e no afastamento, ora na presença e comunhão do legado. Venha o diabo e escolha o bom do mau, o péssimo do maravilhoso, o criador do repetitivo.



Quando um artista morre é porque nos deixou não deixando, ou deixando morreu antes do tempo. Mas amanhã é outro dia e, talvez, surja um outro artista e outros caminhos pela descoberta dos mistérios da vida.



E, vos deixo com as palavras do filósofo e escritor francês, que viveu no século XVIII, Jean Jacques Rousseau:




“Morro aos poucos em todos aqueles que gostam de mim.”

segunda-feira, 4 de abril de 2016

5/12










João Alfaro

Pinturas sobre tela ( primeiros esboços)




Agora tenho em mãos um novo projecto que é, como todos os outros no domínio pictórico, um desafio que se traduz em pintar, para um espaço belíssimo, doze telas em que a temática é a natureza, para que faça sentido a relação entre a arte e o enquadramento envolvente. Por breves instantes tive de interromper a temática que agora predomina na minha pintura e que surgiu também de um desafio que me foi apresentado então. Do que gosto mesmo é de ir desbravando caminhos numa eterna procura, para que faça sentido e seja aliciante o esforço e a dedicação, porque, tal como na vida, a monotonia é o que nos destrói e nada melhor que procurar e procurar sempre novos desafios, mesmo sabendo que tudo deixa um rasto, e na pintura uns temas conduzem a outros, como acontece no dia a dia.


Quando me é proposto um trabalho procuro sempre, até chegar ao objecto final, fazer muitos estudos e provas extras, porque só assim se consegue aperfeiçoar o pretendido. Fica, no entanto, sempre em mim um sentimento de inquietude e de não ter atingido o desejado. Sou assim. Entre as dúvidas, os medos e a certeza o que fica é o momento e o sonho.




E vos deixo com as palavras da poetisa Florbela Espanca, que um dia escreveu:



“O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesmo compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que se não sente bem onde está, que tem saudades... sei lá de quê!”