segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Gente boa







 
 
João Alfaro
Desenhos, 2015
 
 
 
Há tanta gente boa. Uns perdidos e desencontrados, outros fantasiando, lutando e ainda crentes. Todos percorrem os dias numa encruzilhada de encontros e de despedidas. É, nesse olhar, que o meu caminhar me leva a querer retratar a dimensão humana, agora, sobretudo, o lado mais intimista, na serenidade e no recato, de uma vida em que tudo se resume a um sopro de ilusões e de algumas certezas.
 
A arte é o reflexo de um tempo que usa os meios e processos contemporâneos para se afirmar. A internet permite a globalização e o rápido comunicar de ideias, métodos e intenções, razão para tanto mostrar, passo a passo, o meu trabalho, aqui. Cabe ao artista dar ênfase ao idealizado e eu, neste ver martirizado da inquietação que cada um transporta consigo, quero mostrar que não há só tristeza, nem memórias nefastas, mas um outro lado dos silêncios que cada um tem e, que é um gostar da alma gémea, esteja ela onde estiver. É esse lado mais secreto que as poses e o olhar me atraem sempre que retrato alguém, porque é o desejo expresso de deslindar a singularidade de cada um.
 
 
 
E vos deixo com as palavras que um dia Gustave Flaubert, escritor francês do século XIX, disse:
 
“A arte é, de todas as mentiras, a que engana menos.”


terça-feira, 25 de agosto de 2015

E já passaram vinte anos

 
 
 
 
 
 
João Alfaro
“Daniela e Caty”, 2015
Desenho: pastel de óleo sobre papel Canson
 
 
 
 
Em 95 fui a Londres. Não resisti e entrei naquela loja. Em vez de adquirir as eternas peças turísticas que fazem parte das viagens, para mais tarde recordar, eu fiz o que é muito meu: sempre que vejo materiais de pintura não resisto. Compro e compro. Só não consigo consumir ao ritmo das aquisições. E tudo se vai acumulando: telas, pincéis sem fim, papéis, cartolinas, paletas, fitas, tudo, tudo. Agora, passados vinte anos, por artes mágicas encontrei a caixa de pastéis de óleo adquirida nessa viagem. Foi um outro modo de recordar um tempo e, de imediato, comecei a fazer uso da quase intacta caixinha das cores. Mais uma nova fase surgirá agora com a utilização deste específico meio riscador. E, transformado numa criança acabada de receber uma prenda, só me resta desenfreadamente trabalhar com as armas que tanto me fascinam. Eu sou assim.
 
 
 
Convidado para expor, brevemente, num espaço relativamente pequeno e, porque gosto que cada evento meu seja, sempre que possível, composto por pintura nunca antes mostrada publicamente, estou agora numa saudável azáfama para corresponder aos que em mim acreditam. Surge, por esta razão, uma exposição que será composta pelo retrato de algumas das pessoas que comigo colaboraram como modelos e que agora me cabe prestar uma homenagem, porque faço da minha pintura uma ilustração dos que me rodeiam. A mostrar em novembro.
 
 
 
 
E vos deixo com as palavras de Carlo Goldoni que um dia disse:
“Discutir gostos é tempo perdido; não é belo o que é belo, mas aquilo que agrada. “

 


segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Dois anos depois

 
 
 
 
João Alfaro
"João"
Desenho, grafite sobre cartolina de 34x24 cm
 
 
 
 

“Não, não quero mais gostar de ninguém porque dói. Não suporto mais nenhuma morte de ninguém que me é caro. Meu mundo é feito de pessoas que são as minhas – e eu não posso perdê-las sem me perder.”
 
Clarica Lispector in “A Descoberta do Mundo“
 
 
Dois anos depois, entre as brumas da memória, há tanto para recordar; uns sem medo e outros definitivamente diferentes. Receosos e perdidos perante a fragilidade da vida, os que tanto presenciaram no centro do vulcão a tragédia humana, os dias sucedem-se, com os momentos banais e o querer encontrar distrações do pensar, porque só no devaneio se suporta a ausência. E nada mais resta senão compreender quem somos, donde viemos e para onde vamos. Pelo meio o mais desejado é o que nos faz mais mal: o amor.
 
 
 
E vos deixo com a voz de José Afonso e “Balada de Outono”.
 
 
 
 


segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Curvas e contracurvas

 
 



João Alfaro
“Selene”, 2015
Pintura sobre tela de 80 x 120 cm
 
 
 
Nas muitas voltas que o mundo dá cada novo dia é um enigma, mesmo que quase tudo seja sempre expectável, ou não fosse a rotina o usual dos dias. Com o acreditar que é preciso lutar para que o amanhã se transforme positivamente, o trabalho é a fonte da realização e do sonhar também. Estar ocupado, dar um sentido, uma determinação e uma significância ao que andamos a fazer neste tempo e neste espaço, mergulhado nos devaneios das especulações sobre a importância da vida e o que ela é neste domínio e nos hipotéticos patamares de eternidade, faz parte do querer simbolizar um pedaço de história, pelas melhores razões. Mas a memória se vai e o que ela tem de verdade é apenas um olhar que tudo muda. Hoje a leitura é diferente de tudo o que lá vai, e será outra coisa qualquer num outro tempo com outras gentes. Nada de extraordinário, porque mudam-se os tempos e mudam-se as vontades.
 
 
Eu só quero pintar, como se todo o resto fosse tão distante e nada mais tivesse importância. É terrível pensar assim. Mas só pintando julgo dizer tanto. Já não gosto de me apresentar publicamente e discursar. Detesto. Confesso. Hoje ando a fugir de tanto que foi o meu passado. Apenas quero-me cingir ao meu mundo das artes plásticas, como se a brevidade do andar neste caminho da vida fosse para acabar já amanhã.
 
 
“Selene” é apenas um nome que simboliza a beleza feminina, tanto do meu agrado e tema recorrente agora no meu trabalho, porque do muito que há neste mundo de disparidades, nada melhor que o gostar. Entre as curvas e contracurvas que a procura transporta na ânsia do caminho idealizado, o melhor é amar.
 
 
E vos deixo com as palavras que um dia Máximo Gorky disse:
 
“Procura amar enquanto vives. Não se encontrou nada de melhor.”
 
 


E amanhã como será ?




 


 

João Alfaro

“Selene”, 2015

Pintura sobre tela de 80x120 cm (em construção)

 

Amanhã não sei como estará o desenvolvimento deste trabalho. Felizmente. É a incerteza do evoluir da pintura que me fascina, mesmo que isso signifique sempre, mas mesmo sempre, muito procurar, com as dúvidas constantes e o saber que jamais conseguirei chegar ao pretendido. O tempo passa e por muita dedicação e entrega tudo parece ter os resultados do costume e a mesma insatisfação de todos os dias. Nada muda, apenas a consciência latente do quão difícil é percorrer caminhos impregnados de tanta interrogação. Mas não sou de desistir, bem pelo contrário, cada vez mais me deixo enlear no maravilhoso mundo que é produzir pelo prazer do fazer, sem que haja outro objetivo senão de querer ir por aí num imaginário de fantasia, em que o observar é o fulcral para o que me interessa, como se todo o resto fosse apenas insignificante, e a pintura o alimento da vida. Da minha. Obviamente.

 

A sensualidade e a beleza são condimentos do desejo, da vaidade, do gostar de estar bem, que é muito do que retrato, onde as personagens se extasiam nos jogos do encantamento. Aqui, mais uma vez, tento pintar o lado intimista com os considerandos que hoje comungam os valores estéticos deste tempo de tanta dúvida.

 

 

 

Recordo hoje as palavras de Leonardo  de Vinci, genial artista e cientista que um dia disse:

 

 

“O conhecimento torna a alma jovem e diminui a amargura da velhice. Colhe, pois, a sabedoria. Armazena suavidade para o amanhã. “

 

 
 


terça-feira, 4 de agosto de 2015

Brevemente


 






Não sei se é da irreverência e do desassossego constante, que me persegue em busca de nova figuração, o que sei é que vou, mais uma vez, desenhar compulsivamente, porque me conheço e irei descobrir outros caminhos, que é o procuro, para que se mantenha a chama ardente da paixão artística, razão para tanta entrega, neste meu querer, pois é o melhor que tenho para alcançar, com as forças que me acompanham, apesar de tantos percalços e eternos desencontros, mas só sei que a solução está em continuar e acreditar até ao fim. E eu não sou de desistir. Nunca.

 

 

Quando era miúdo li as cartas do Van Gogh, do que ficou, registo a paixão pelo trabalho que ele ia fazendo e, sobretudo, a verdade enquanto homem. Foi um daqueles livros que me marcou e definiu a minha personalidade: entrega às paixões. Uma paixão é um momento doentio de exaltação, que é fundamental para o equilíbrio da monotonia quase permanente dos dias. De paixão em paixão se faz uma vida. A minha também. A pintura é uma delas (para mim), e é, onde posso mostrar o meu silêncio. O resto pouco importa. O mercado é o que é. Importante é ir fazendo e mostrando, agora aberto ao mundo, mesmo que só pela imagem virtual.

 

 

 

 

E vos deixo com as palavras que um dia Georg Hegel disse:

 

“Nada de grande se realizou no mundo sem paixão. “