sexta-feira, 4 de junho de 2010

Espelho meu






“Fosse eu apenas, não sei onde ou como,
Uma coisa existente sem viver,
Noite de Vida sem amanhecer
Entre as sirtes do meu dourado assomo....

Fada maliciosa ou incerto gnomo
Fadado houvesse de não pertencer
Meu intuito gloríola com Ter
A árvore do meu uso o único pomo...

Fosse eu uma metáfora somente
Escrita nalgum livro insubsistente
Dum poeta antigo, de alma em outras gamas,

Mas doente, e , num crepúsculo de espadas,
Morrendo entre bandeiras desfraldadas
Na última tarde de um império em chamas... “


Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"


Estas duas telas, de pequeno formato, pintadas em 96, são o registo de ambientes onde as imagens se sobrepõem num jogo de aparências reais e virtuais. A verdade é muitas vezes um intrincado processo de descodificação, que confunde pela semelhança ou pela profunda diferença. Aqui, a conjugação entre a aparente imagem espelhada e a não espelhada é, afinal, apenas mais uma vez, a continuação da ilusão que é a arte e, tantas vezes, a vida.

Estas pinturas fazem parte da série de retratos onde o espelho está presente e em que procurei, de um modo breve, com rostos definir jogos de cores num contexto temático, onde a fisionomia e a caracterização do carácter definem a personalidade de cada um. História da Minha Pintura.

Recordo hoje as palavras de Oscar Wilde:

“São as personalidades e não os princípios que fazem avançar o tempo.”

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