domingo, 11 de abril de 2010

Casas



Na Casa Defronte


Na casa defronte de mim e dos meus sonhos,
Que felicidade há sempre!

Moram ali pessoas que desconheço, que já vi mas não vi.
São felizes, porque não sou eu.

As crianças, que brincam às sacadas altas,
Vivem entre vasos de flores,
Sem dúvida, eternamente.

As vozes, que sobem do interior do doméstico,
Cantam sempre, sem dúvida.
Sim, devem cantar.

Quando há festa cá fora, há festa lá dentro.
Assim tem que ser onde tudo se ajusta —
O homem à Natureza, porque a cidade é Natureza.

Que grande felicidade não ser eu!

Mas os outros não sentirão assim também?
Quais outros? Não há outros.
O que os outros sentem é uma casa com a janela fechada,
Ou, quando se abre,
É para as crianças brincarem na varanda de grades,
Entre os vasos de flores que nunca vi quais eram.
Os outros nunca sentem.

Quem sente somos nós,
Sim, todos nós,
Até eu, que neste momento já não estou sentindo nada.

Nada! Não sei...
Um nada que dói...


Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Esta pequena tela, feita em tempos idos, é um estudo do espaço, da luz, da sombra e das cores. Quando quero ir por outros caminhos faço exercícios de cor e de enquadramento para, antecipadamente, antever trabalhos de outra escala. Aqui a temática é a do costume: cenário intimista com a figuração usual. O objectivo foi essencialmente combinar tonalidades e ver os contrastes. História da Minha Pintura.


E vos deixo com a música de Brahms.

Sem comentários:

Enviar um comentário