segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Rotina

 
 

 
 






 
 
 
João Alfaro, 2015
Desenhos sobre papel Canson
 
 
 
 
Quando o calor se vai chegam os dias cinzentos e a atmosfera do sentimento transforma-se. Gosto de ver pessoas e cores e movimento e vozes e desejos. E tantas outras coisas. Mas a chuva vem e tudo fica diferente: as pessoas fogem, o cinzento domina, e a solidão conquista espaço e tempo. Na rotina dos dias procuro sempre adquirir um brilho e, por isso, o meu trabalho pictórico é uma procura permanente, numa aliciante descoberta que me abraça na vontade de continuar crente em imaginários, enquanto a tormenta acontece, com o deixar de ir por aí ,e, ficar na rotina...
 
Mesmo que tudo seja igual, há o meu olhar que é só meu, e que procuro, através da pintura, deixar um registo da banalidade que é, também, encantador e sublime quando um homem olha para uma mulher e vê quanta é bela a presença feminina, nos gestos mais supérfluos do correr dos dias, nos momentos banais ou enfatizados.
 
Agora a preparar uma nova exposição em que a dominante temática é a representação feminina, sobretudo, através da expressividade  gestual nos episódios rotineiros que, relatam posturas íntimas do viver, e que eu transformo em pintura e em desenho.
 
 
 
 
E vos deixo com as palavras ditas no século XVII num sermão pelo padre António Vieira:
 
 
“Não há coisa tão preciosa, e tão útil, que continuada não enfade.”
 


segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Tempo Contado

 
 
 
 
João Alfaro
 "Banho", 2015 ( em construção)
Desenho a grafite sobre papel canson 59x42 cm  
 
 
 
 
 
 
É um dado absoluto: o tempo está sempre a contar. Melhor dizendo: a descontar. Por outras palavras: a vida – a nossa – tem um tempo contado. Não se compra, nem se vende. Só teoricamente. Em vez de estar aqui forçado, se tenho outros proventos, posso usufruir de outras paisagens, de vivências aprazíveis, de paradisíacos desejos momentâneos. Isso é tempo. Consumido num gostar de estar. Mas não mais do que isso. A verdade temporal, por muito que doa, é um mistério da vida. É sempre curta, mesmo para aqueles que se arrastam. E são muitos. Mesmo sapientes da precaridade tudo gira como se fosse crescente e proveitoso o dia de amanhã. É a esperança no milagre da felicidade, no acreditar que vale a pena, mesmo que muito nebulosos sejam os caminhos, mas, felizmente que há este rasto de força interior para dar a volta e, seguir em frente à procura da paz, nem que ela seja, afinal, um conto mal contado, como o tempo.
 
 
 
Há tanto caminho e mais caminhar e, no entanto, o tempo tem um tempo. Ou se chega a tempo ou nunca se chega, porque o tempo é outro, de outros e não nosso. Só nosso. Prisioneiro me sinto, incapaz de estar em tanto lado. É tudo uma opção de vida com muito amor ou sem ele, talvez, porque o tempo é tempo contado.
 
 
E vos deixo com as palavras da romancista francesa, do século XX,  Anais Nin que um dia disse:
 
“O único transformador, o único alquimista que muda tudo em ouro, é o amor. O único antídoto contra a morte, a idade, a vida vulgar, é o amor. “

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Se eu soubesse

 
 
 
 
 
 
 João Alfaro
“Marta IV”, 2015
Desenho a grafite sobre papel canson 59x42 cm
 
 
 
Vivo numa obsessão pictórica. Fora do meu ateliê sinto-me perdido. Longe vão os tempos do querer isto ou aquilo, projetar para o futuro, conceber ideais de felicidade e gostar de gostar. Agora tudo parece diferente. Sou outro. Quanto mais trabalho mais quero fazer, mesmo sabendo o destino previsível das peças que vou criando e, em simultâneo, ando sempre impaciente com tudo e com todos. É este vazio que o trabalho artístico compensa com tanta entrega, mesmo que tudo se desmorone. Se eu soubesse como ultrapassar este confronto entre os valores, a moral e o bem-estar era diferente, se a memória não fosse o que é. É pois este rol de inquietude que é anestesiado com o desejo frenético de criar continuamente, para que haja uma razão plausível e significativa do viver segundo um ideal. Os dias passam, a vida também, e, com ela, as muitas histórias com gente dentro.
 
A vida é fascinante porque tem tanto de belo para usufruir. Basta, por vezes, tão pouco para preencher e alegrar, e, se eu soubesse como fazer para viver mergulhado no encantatório dos prazeres tudo seria bem diferente, paradoxalmente o que eu pinto hoje, e de  que gosto tanto, não existiria, porque a arte é a expressão da verdade sentida.
 
 
 
E vos deixo com as palavras do escritor, poeta, dramaturgo e ensaísta irlandês do século XIX Oscar Wilde que um dia disse:
 
 
“As nossas tragédias são sempre de uma profunda banalidade para os outros.”


quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Quando eu gosto

 
 
 
 

 
 
 
 
Este blog começou por ser diário, como todos devem ser para cativar e mostrar consistentemente, mas, por razões temporais e logísticas, de diário passou a semanal e publicado inicialmente ao sábado, depois ao domingo e agora às segundas-feiras, exceto quando por razões excecionais ( como é o caso de hoje) é outro o dia para expor este meu olhar sobre, essencialmente, a minha pintura e um pouco de mim, confesso.
 
Para breve uma exposição onde o desenho é dominante, porque, querendo eu sempre, em cada mostra pictórica tornar específico o evento, e dando um cunho temático referencial, surgiu, por questões temporais, a necessidade de conceber um conjunto de trabalhos homenageando algumas das pessoas que me serviram de modelos e, considerando as características específicas do espaço e do público da galeria, pareceu-me adequado juntar pintura em tela e desenho em papel, para completar um olhar sobre o meu modo de trabalhar.
 
Na procura constante em estar envolvido em projetos vários, como modo de completar um sentido vivencial e um projeto de vida, a arte é dominante neste meu modo de estar aqui e agora. Gosto de gente e quando eu gosto, retrato muito, talvez por isso, agora, o meu interesse não seja a ilustração de objetos, nem de espaços citadinos, nem de paisagens, mas de gente de carne e osso que fazem ou fizeram parte do meu viver, porque, a arte só tem sentido e significância quando é um espelho de nós na sua globalidade, e, não um vazio cognitivo.
 
 
 
E, vos deixo com as palavras do escritor, poeta, dramaturgo e ensaísta Oscar Wilde que um dia disse:
 
“Todos nós, sem exceção, passamos a vida à procura do segredo da vida. Pois bem: o segredo da vida reside na arte. “